Uma democracia sangrenta
O jornalismo
teme a opinião pública, assegurou George Orwell no esquecido posfácio de A revolução dos bichos. Creio que ele
estaria de acordo com a ideia segundo a qual o “jornalismo teme a opinião
pública bem informada”, razão pela
qual alguns temas são, a despeito de sua importância, olimpicamente
desconsiderados enquanto outros, completamente banais, tornam-se uma constante
no noticiário como se de fato fossem decisivos para a vida de milhões de
pessoas.
Esta é a norma
do jornalismo dominante nas sociedades democráticas. Os liberais asseguram que
um sistema democrático deve preservar a “imprensa livre” e a “liberdade de
expressão”. Estas virtudes ou exigências democráticas somente poderiam ser
asseguradas com a existência e manutenção dos monopólios dos meios de comunicação
– a empresa privada – que, em consequência, estaria imune a razão de estado,
distante da influência política partidária e livre para publicar o que
realmente importa à cidadania, especialmente aqueles temas que podem ser
inconvenientes para o poder. Na prática, nas faculdades de jornalismo ou
comunicação social a grade curricular esta organizada para garantir este mito
liberal e supostamente para formar um profissional competente para o “mercado
de trabalho”, este eufemismo destinado a ocultar o poder monopólico sobre os
meios de comunicação.
Neste contexto,
é normal que um profissional assegure com plena convicção que jamais foi
censurado quando trabalhava em tal ou qual monopólio e que nunca recebeu ordens
sobre o que e como escrever uma determinada matéria. Ele realmente acredita que
exerce na plenitude a liberdade de imprensa. Contudo, o que ele sequer suspeita
e dificilmente admitiria, é o fato de que não seria contratado se já não
soubesse o que realmente importa para o jornal ou a TV que lhe paga o salário.
Em poucas palavras: quando contratado, o jornalista não será censurado jamais
porque ele sabe, objetiva e subjetivamente, o que realmente escrever. Esta é a
razão pela qual alguns temas são sistematicamente mantidos fora da atenção
pública enquanto outros – decididamente menos relevantes ou mesmo banais –
recebem um minucioso tratamento.
É fácil perceber
o caráter ideológico da liberdade de imprensa em ação. O Brasil, por exemplo,
acumulou nos últimos anos uma dívida interna gigantesca que já alcança a cifra
de 3 trilhões de reais. Outro tanto ocorre com a dívida externa, superior aos
311 bilhões de dólares. É um tema explosivo com enorme repercussão na
capacidade de investimento do estado brasileiro, afeta decisivamente a eficácia
e alcance da política pública, implica em acentuada redução do exercício de
soberania estatal; mas o tema inexiste para os guardiões da liberdade de
imprensa. O tempo destinado à metereologia é indiscutivelmente maior do que
aquele reservado ao endividamento interno e externo do estado brasileiro. O
tempo destinado aos comentaristas de futebol representa um abismo quando
comparado com aquele reservado ao tema da dívida estatal. Finalmente, o tempo destinado a acidentes de
transito ou a qualquer banalidade da vida universitária, recebe um tratamento
minucioso enquanto os assuntos de estado, verdadeiramente públicos, são
sistemáticamente ocultados.
Algo similar
ocorre com informação sobre o cenário internacional. Há temas que merecem plena
atenção dos monopólios de comunicação enquanto outros estão garantidos pela
ocultação sistemática de informação. A Sociedade Interamericana de Imprensa
(SIP), por exemplo, não cansa de acusar Venezuela, Equador, Bolívia e Cuba como
exemplo de países em que se fomenta o medo e o ódio contra os jornalistas e onde
supostamente se pratica atentados diários a liberdade de imprensa. Contudo, na 69 assembleia geral da entidade realizada em outubro de 2013, se confirma que
"quatorze jornalistas foram assassinados nesse último semestre no Brasil,
Guatemala, Haiti e Paraguai, entre outros países, por denunciar os abusos do
poder político e econômico, ou tocar os interesses dos traficantes de drogas —
abusos e interesses que, muitas vezes, vão de mãos dadas", segundo Ricardo
Trotti, diretor da SIP.
Ademais, para a
entidade “a violência é incentivada pelo alto grau de impunidade, produto de
poderes judiciais fracos, ineficientes, ou subjugados pelo poder, o que
permitiu que 17 casos de assassinatos de jornalistas prescrevesse na Colômbia e
no México, depois de 20 anos sem justiça.” Enfim, não somente se mata de
maneira indiscriminada jornalistas em países “democráticos” como também esta
assegurada a impunidade para tais crimes. Contudo, toda semana podemos assistir
nos canais de televisão em nosso país matérias sobre a séria ameaça à liberdade
de imprensa pela “ideologia bolivariana”.
Não é necessário
muito esforço para perceber que um modelo de propaganda se reproduz no
jornalismo brasileiro. Após intensa campanha midiática, qualquer pessoa mais ou
menos “informada” pelos monopólios dos meios de comunicação no Brasil sabe que
existe uma séria “ameaça” a democracia nos países governados por líderes
populares que decidiram democratizar minimamente a informação (Venezuela,
Equador, Bolívia e Argentina). Contudo, o fato de que a absoluta maioria de
assassinatos de jornalistas ocorra no México e na Colômbia parece não
constituir uma ameaça à liberdade de imprensa e, por esta razão, é simplesmente
ignorada pelo jornalismo dominante. Mais grave ainda: precisamente nos dois
países – completamente alinhados com Washington – a impunidade é tal que os
crimes prescreveram, fato que representa uma clara garantia de livre trânsito
para sicários e assassinos a serviço do poder de estado e das corporações de
todo tipo. Em consequência, é muito difícil – quiçá impossível – ler num jornal
e absolutamente impensável ver na TV brasileira, que na Colômbia e no México a
liberdade de imprensa esta ameaçada. Não há sequer menção aos dois países,
embora qualquer estudantes de ciências sociais medianamente formado sabe que se
trata de dois casos limites no continente latino-americano.
Diante desta
realidade, os guardiões da liberdade não vacilam: silêncio sobre a realidade
colombiana e mexicana. Na mesma linha, acendem todas as “luzes” sobre
Venezuela, Argentina, Bolívia e Equador. A regularidade do fenômeno indica
claramente que o jornalismo se transmutou num modelo de propaganda que somente em casos limites e excepcionalmente
altera seu comportamento. Noam Chomsky afirmou que, diante do fenômeno, o
resultado do sistema de liberdade de expressão representa um “sistema de
controle ideológico muito eficiente – muito mais eficiente do que o
totalitarismo soviético jamais foi”.
O livro dos
jornalistas Matheus Lobo Pismel e Rodrigo Simões Chagas – Colombia. Movimentos pela paz – pratica, em oposição ao jornalismo dominante, uma
crítica necessária e esclarecedora contra o modelo de propaganda em que aquela
promessa liberal se transformou. Não deve passar sem registro que eles
escreveram este trabalho quando ainda não haviam recebido o diploma de
jornalistas. Eram, portanto, estudantes. A curiosidade intelectual os motivou a
permanecer dois meses no país vizinho e realizar um belo trabalho para todos
nós; um trabalho que combate a imensa ignorância brasileira sobre a América
Latina, mesmo quando se trata de um país vizinho. Eles romperam com o
academicismo alienante e esnobe que acompanha a formação do universitário em
nosso país e se lançaram sem os temores contra o “bom mocismo” que orienta a
profissão do jornalista desde os primeiros passos.
El Cazador, de Fernando Botero |
A Colômbia é, de
fato, uma democracia sangrenta, tal como os autores caracterizam o regime
político no país. O adjetivo pode parecer abusivo para a consciência ingênua
sobre a realidade colombiana produzida pelos monopólios da comunicação no
Brasil. Contudo, as evidências são abundantes, pois desde o Bogotaço de 1948 as
classes dominantes desataram uma guerra contra as classes populares que jamais
cessou. Na prática, a democracia sangrenta é resultado de uma modalidade
particular de regime político que somente pode passar despercebido até agora em
função da completa cumplicidade dos monopólios dos meios de comunicação
empenhados não somente em ocultar dados elementares por eles apresentados, mas,
sobretudo de silenciar sobre os piores crimes cometidos cotidianamente no país.
A Colômbia vive um regime de terrorismo de estado que seria impossível sem o
apoio sistemático dos Estados Unidos. Não se trata somente do Plano Colômbia –
um eufemismo utilizado por Washington para estabelecer bases militares, dirigir
as forças armadas nacionais, financiar a guerra e acumular riqueza em favor de
uma pequena elite nacional – senão de respaldar por meio da diplomacia e de uma
poderosa máquina de propaganda que, ao contrário das ditaduras que sofremos
durante décadas, a Colômbia era uma democracia plena.
O terrorismo de
estado – praticado e larga escala pelos Estados Unidos no mundo – se verifica
de maneira trágica na Colômbia cujo resultado pode ser medido pelo fato de que
apenas 1,15% dos colombianos controlam 52% das propriedades deste rico país.
Como foi possível tamanha concentração da propriedade? A classe dominante
colombiana moveu uma guerra contra os camponeses que produziu – segundo cifras
conservadoras – mais de 220 mil mortos, 25 mil desaparecidos e pelo menos 30
mil sequestrados. Ainda mais trágico, a decisão da classe dominante com apoio
completo do estado criou a figura dos “desplazados” de guerra, aproximadamente
6 milhões de camponeses que foram obrigados pela força do exército e
especialmente dos paramilitares a abandonar suas terras ou “vendê-las” a preço
de banana com o único objetivo de salvar suas próprias vidas. Este mega
processo de expropriação concentrou ainda mais a terra num país cujo conflito
entre governo e a guerrilha nasceu precisamente em função da extrema
concentração da riqueza e da propriedade e seu corolário inevitável: a maior
parte da população afundada na pobreza.
Nestas
circunstâncias, a Colômbia funciona como espécie de estado-satélite, com
autonomia reduzida, um instrumento da política imperialista dos Estados Unidos
na América Latina. A ação imperialista combinou a criação de bases militares na
Colômbia – um assunto com gravíssimas implicações para todos os demais países
da região – com a promoção do acordo de “livre comércio” que já produziu
efeitos ainda mais perversos na agricultura colombiana. Nenhuma novidade, pois a
simples análise das consequências do Tratado de Livre Comércio entre EUA,
Canadá e o México, levaria qualquer observador às evidências elementares sobre
as consequências para o país latino-americano que, após o tratado, passou a
importar inclusive milho da potência imperialista.
Não somente por
estas razões – suficientemente fortes – mas também porque temos uma importante
fronteira com a Colômbia, as atenções das universidades, do jornalismo e da
política externa nacional deveriam estar voltadas para este conflito que possui
implicações mundiais e estratégicas para nós. Contudo, a ignorância brasileira
sobre o terrorismo de estado segue sendo produzida, razão pela qual é possível
observar o desprezo sistemático dos teóricos da democracia e dos defensores da
liberdade de imprensa sobre esta enorme tragédia. É preciso agregar que esta
ignorância produzida pelo modelo de propaganda vigente consiste precisamente em
opor os regimes democráticos (Colômbia ou México) de outros (Venezuela, Equador,
Bolívia e, obviamente, Cuba) cuja democracia supostamente se encontra baixo
grave ameaça ou simplesmente não existe. Esta realidade poderia ser estuda por
qualquer pessoa mediamente informada – e com duas moléculas de honestidade
intelectual – e considero digno de atenção o desprezo que merece em nosso país.
É tal o êxito da operação ideológica construída pelo modelo de propaganda que
uma pesquisa de opinião constataria que para a maior parte dos brasileiros que
algo “sabe” sobre a tragédia colombiana não vacilaria em afirmar que tudo se
resume ao conflito governo versus guerrilha quando todas as fontes indicam –
mesmo aquelas mais conservadoras – que o maior número de vítimas não decorre
dos combates entre exército e as FARC (ou ELN), mas precisamente dos massacres
promovidos pelos paramilitares, pela “segurança privada” de latifundiários e
políticos a serviço do sistema, e de um eficaz sistema judicial que basicamente
garante a impunidade para os assassinos.
Manuel Marulanda, de Fernando Botero |
Entre nós se
consolidou a ideologia segundo a qual não existe na Colômbia uma opção de
esquerda civil, disposta a disputar o poder pela via das eleições, razão pela
qual não restaria ao estado senão a guerra contra a subversão. Rodrigo e
Matheus revelam precisamente o oposto ao resgatar a importância histórica de
iniciativas eleitorais – com partidos e frentes de esquerda sem qualquer
vínculo com a luta armada – que de maneira heroica tentam construir no país
vizinho uma saída para a guerra e, precisamente por isso, foram
sistematicamente perseguidos e viram milhares de seus militantes assassinados de
maneira impune na Colômbia. A trajetória da União Patriótica (UP) revela o
quanto a guerra – e o regime de terrorismo de estado – é a opção preferencial
das classes dominantes colombianas com apoio sistemático dos Estados Unidos. O
assassinato do candidato liberal Jorge Eliézer Gaitán em 9 abril de 1948
inaugurou meio século de “violência” na Colômbia e não deixou de ceifar vidas
de outros tantos candidatos a presidência assassinados brutalmente em plena
luta eleitoral, quando defendiam uma saída negociada para o regime de
terrorismo de estado atualmente vigente. Não cabe, pois, após examinar esta
trajetória aqui recuperada, falar somente na existência da “violência”
generalizada no país. Considerando o caráter sistemático que a “violência” assumiu,
a longevidade que possui e a resistência das classes dominantes em aceitar com
seriedade uma saída pacífica para a crise, temos a obrigação de analisar a
hipótese sobre o terrorismo de estado como um regime que combina eleições regulares
com assassinatos em massa. Portanto, é adequada – ainda que trágica – a
denominação de uma democracia sangrenta
com a qual os autores denominam o regime político colombiano. Uma democracia sangrenta – portanto,
adjetivada – escapa por completo aos marcos analíticos da sociologia da ordem
produzida pelo liberalismo político cujo único interesse consiste em opor de
maneira simplória regimes “democráticos” a regimes “totalitários” ou
“autoritários”. Na Colômbia, há “imprensa livre”, os tribunais funcionam,
existem eleições periódicas, não existiu no último meio século um golpe de
estado destinado a levar os militares ao poder – tal como nas ditaduras
militares que sofremos no cone sul – e, não obstante, os resultados são em
muitos aspectos, ainda piores que aqueles produzidos pelas ditaduras militares.
O regime de
terrorismo de estado ganhou nova roupagem durante o governo do presidente
Álvaro Uribe Vélez e durante seu governo aplicou a política de “segurança
democrática” destinada a produzir mais uma operação orwelliana: mudou o Plano
Colômbia (1998) – a principal peça do terrorismo de estado – para o Plano
Patriota, a mesma política com maior liberdade ainda para o estado mudar a
constituição, fazer letra morta de outros tantos artigos e seguir produzindo
miséria, exploração e violência em amplos setores sociais, especialmente a
massa de camponeses.
Não por acaso, a
violência se multiplicou durante o período presidencial de Uribe, pois a
política de “segurança democrática” sempre foi uma estratégia de guerra total dirigida não somente contra
a guerrilha, mas, sobretudo, contra todos os setores sociais com alguma
capacidade de reivindicação e organização – sindicatos operários e camponeses,
movimentos indígenas, intelectuais críticos, jornalistas independentes – que
formam agora, mas do que em qualquer outro período da história colombiana, uma
imensa comunidade de vítimas. Há pouco, Uribe elegeu-se senador novamente. O
papel político que representa agora é uma extensão de político-parlamentar de
seu período presidencial e sem dúvida alguma seguirá atuando contra toda e
qualquer possibilidade de acordo político entre o governo do presidente Juan
Manuel Santos e as FARC que atualmente se realiza em Havana. Mais importante
ainda, seu discurso e sua prática pretendem eternizar o regime de terrorismo de
estado com amplo apoio dos Estados Unidos. A revista Newsweek publicou o conteúdo de informes produzidos em 1991 e
finalmente desclassificados agosto de 2004 pelo Departamento de Defesa, nos
quais Uribe aparecia como colaborador do Cartel de Medellin e figura muito
próxima de Pablo Escobar. Em 1990, começou o segundo mandato como senador, foi
também governador de Antioquia e, finalmente, em 2002 Uribe elegeu-se
presidente com óbvio apoio dos Estados Unidos. O episódio revela que antes que
um problema moral, a política estadunidense esta submetida à razões de estado,
motivo pelo qual o antigo membro da blacklist,
figura supostamente detestável para a política anti-drogas da potencia
imperialista, se transformou em “defensor da democracia e dos mercados livres”,
peça fundamental da expansão imperialista na América Latina e figura destacada
na luta contra a “narco-guerrilha”, na expressão de Ronald Reagan. Esta súbita
e cínica mudança obedecia ao fato de que precisamente naquela conjuntura os
resultados das chamadas “reformas neoliberais” produziam resultados
contraproducentes para a eficácia da dominação política em nosso continente.
Emergia, naquele momento, aquilo que o General James T. Hill, chefe do Comando
Sul dos Estados Unidos, chamou de “populismo radical”, ou seja, a aparição de
líderes com capacidade de radicalização. Nas palavras do general – pronunciadas
numa comissão do senado estadunidense – esta radicalização era produto “das
profundas frustrações derivadas do fracasso das reformas democráticas em fazer
chegar os bens e serviços prometidos, Utilizando estas frustrações que se
combina com as frustrações causadas pela desigualdade econômica e social, estes
líderes são ao mesmo tempo capazes de reforçar suas posições radicais
inflamando o sentimento anti-estadunidense”.
Não por acaso,
Uribe confrontou sempre que pôde a política do presidente Hugo Chávez, mesmo
quando este declarou de maneira clara que o tempo da luta armada havia sido
superado e que correspondia, em consequência, a luta pela democracia
participativa e protagônica que o líder bolivariano fomentava em seu país.
Desde Venezuela, o presidente Chávez clamou pela negociação e para que o
governo colombiano reconhecesse o caráter de força beligerante às FARC, antes
que simplesmente considerá-la uma “narco-guerrilha”, conceito que eternizaria a
política anti-drogas dos republicanos nos Estados Unidos e, responsável última,
pela manutenção do terrorismo de estado na Colômbia.
Ainda não
sabemos como terminará a atual negociação entre o governo e as FARC. Contudo,
mais importante que prever ou torcer para um final feliz, é estudar as raízes
da violência na Colômbia e a evolução de um regime de terrorismo de estado que
segue intacto e produzindo vítimas em escala monumental. O livro de Matheus e
Rodrigo é uma contribuição notável nesta direção. É também um ativo ato de
solidariedade às vitimas da máquina de guerra que parece não ter fim na
Colômbia e que encontra nos Estados Unidos um ponto fundamental de sustento. O
estado brasileiro não pode permanecer ignorando ou simplesmente atuando com
baixo perfil nesta imensa tragédia que nos afeta diretamente como parte da
comunidade latino-americana a qual pertencemos. Os brasileiros não podem
tolerar mais o rebaixado horizonte da política partidária que sofremos e no
qual os temas estratégicos de segurança e solidariedade entre os povos
latino-americanos sigam ditados pelos interesses estadunidenses e não pelas
necessidades de milhões de pessoas que estão longe – muito longe – de merecer
um tratamento destinado a pessoas.
Finalmente, este livro é também um ato de
honestidade e rebeldia intelectual, uma demonstração cabal de que, mesmo
limitados pelo academicismo alienante e esnobe que domina a universidade
brasileira, somos o suficientemente livres para fazer pequenas escolhas aqui e
agora destinadas a contribuir modestamente com a superação do ambiente estéril
que termina por produzir um silêncio cúmplice com as atrocidades de nosso
tempo.