segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Lula se declara liberal

Nos anos oitenta, quando algum jornalista perguntava ao Lula se ele era de esquerda ou direita, com frequência ouvia como resposta um sonoro "sou torneiro-mecânico". A maior parte de seus apoiadores sorria como quem diz, "o chefe é mesmo foda, sabe sair de qualquer armadilha montada pela imprensa burguesa". Outros, mais afinados com o colonialismo bocó que comanda linguagem, davam de ombros e se deliciavam com a "boutade" do presidente do partido. Nós, desde uma perspectiva de esquerda, caíamos matando, numa tentativa tao importante quanto ineficaz de empurrar o PT para uma posição radical, pretensão que o tempo não tardou em demonstrar que era, de fato, inútil.  

No comando do PT, via Articulação, a antiga tendência majoritária, Lula e Zé Dirceu indicavam que este tipo de definição não interessava aos trabalhadores. Era coisa de intelectuais.... No entanto, mais tarde, quando necessário, a intelectualidade paulista aderiu a Lula sem reservas e demonstrou o quanto pode ser útil no terreno da política. Marilena Chauí foi sem dúvida mais longe que qualquer outro com seu desmedido brado segundo o qual Lula teria capacidade de iluminar o mundo quando falava. Marco Aurélio Garcia, antes dela, "definia" o PT como "pós-comunista" e "pós-socialdemocrata". Entre a apologia e a indefinição, o PT se consolidava como principal partido da ordem no país. Era o que importava, a vida demonstrou.   

Eu sei que após tantos anos de petismo (na oposição e especialmente no governo), é quase ocioso recordar para crescente parte da opinião pública que os governos do PT nada possuem de esquerda. Os banqueiros, latifundiários, industriais e comerciantes desfrutam de um governo orgânico na defesa de seus interesses. No entanto, é também claro que a direita não perderá oportunidade de colar no PT o rótulo de "esquerda", conhecida operação conveniente a ambos: o sistema petucano não medirá esforços para impedir a erupção do radicalismo político que precisamos construir, indispensável para inaugurar no país as grandes transformações inerentes à Revolução Brasileira. Enfim, há um espaço à esquerda para ser ocupado e que não deve ser ocupado... 

É neste contexto que a declaração de Lula em entrevista com blogueiros na semana passada (publicada no Valor, quarta-feira, 21 de janeiro) tem valiosa serventia, pois agora, após tantos anos de clara fidelidade, Lula finalmente assume o liberalismo como bandeira ou ideário. "Sou liberal", disse ele, sem vacilação. Não se trata de surpresa, mas obviamente é um alívio para todos os socialistas, comunistas e revolucionários. O cinismo moderno recebeu nova contribuição mas o desconforto agora não é mais nosso, é assunto dos liberais. 

4 comentários:

  1. Diria Kosik: nesse real constituído pela unidade da essência e do fenômeno, o essencial esteve parcamente camuflado pelo fenomênico...

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  2. Bela lembrança. Kosik sempre indispensável.

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  3. Lula é um tipo especial de pessoa, aquelas que sabem dar nó em pingo d'água. O regime que ele montou tem bolsa BNDES para empreiteiras e agronegócio, bolsa Banco Central para os banqueiros, boquinhas para os companheiros, pixuleco para os dirigentes e as migalhas do banquete para os pobres. Quando leio um artigo desses me lembro de Golbery: "Este homem vai destruir a esquerda no Brasil".

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  4. Lula é um tipo especial de pessoa, aquelas que sabem dar nó em pingo d'água. O regime que ele montou tem bolsa BNDES para empreiteiras e agronegócio, bolsa Banco Central para os banqueiros, boquinhas para os companheiros, pixuleco para os dirigentes e as migalhas do banquete para os pobres. Quando leio um artigo desses me lembro de Golbery: "Este homem vai destruir a esquerda no Brasil".

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