quarta-feira, 2 de novembro de 2022

O ministro Xandão

Não é prudente decretar a morte de qualquer personagem político, exceto quando ele não mais respira. O caso de Alexandre de Moraes, atualmente alçado a condição de um super herói pelo espirito republicano, é um caso típico de quem já esteve próximo do ostracismo e voltou radiante à ribalta. Ele ganhou notoriedade na cena política quando o tucano Geraldo Alckmin o nomeou secretário de segurança em São Paulo em 2014. 

Nos protestos de 2016 organizados pela direita liberal para a destituição da ex-presidente Dilma, o atual "Xandão" viveu dias amargos e chegou a ser expulso da avenida paulista aos gritos de "aproveitador", "mata pobre e mata criança" e "ladrão", segundo a nota do portal G1 da Globo. Não é pouco, convenhamos. Entretanto, os dessabores de março daquele ano não impediram sua nomeação como ministro da justiça de Michel Temer já em maio, pouco tempo antes do afastamento definitivo de Dilma Rousseff. Em 2017, também por indicação de seu colega do Largo São Francisco, chegou ao STF. Uma carreira meteórica em meio a enorme turbilhão político! A História ensina que nas tempestades, além da prudência, também existe espaço para a lucidez e a ambição. 

Pois bem, desde então Alexandre de Moraes não abandonou a condição de protagonista no interior da república burguesa em crise. Até mesmo o experiente Gilmar Mendes, mestre na arte de iludir e outrora figura política central na trama sob condução do rentismo que levou Lula à cadeia, aceitou disciplinado a condição de coadjuvante. Moraes, em momentos cruciais, não vacilou em esquentar a chapa contra o protofascista e, num passe de mágica produzido pela mais absoluta falta de memória histórica, se transformou numa esperança da esquerda liberal cativa das ilusões republicanas. Há que reconhecer a capacidade revelada por Alexandre de Moraes em navegar a favor da maré pois nem todos dominam essa arte; ao contrário, é fácil constatar que muitas figuras (parlamentares, ministros, presidentes, etc) trocam os pés pelas mãos no manejo de duas moléculas de "poder" quando no governo. É chato lembrar isso, eu sei... mas num tempo dominado pela amnésia social, é necessário.

Após a vitória da frente ampla petucana, Alexandre de Moraes liberou uma vez mais o "Xandão". Os liberais de esquerda aplaudem sua decidida atuação contra a Polícia Rodoviária Federal sob comando bolsonarista pois o ministro do STF estabeleceu a multa horária de 100 mil reais ao diretor-geral e anunciou a possibilidade de seu afastamento imediato além de prisão em flagrante por crime de desobediência caso não atue com a energia necessária. A instituição - segundo os monopólios de comunicação (CNN e Globo) - atua com parcimônia cumplice com os baderneiros e, em consequência, os canais de TV estabelecem uma linha editorial repleta de reportagens infindáveis mostrando os prejuízos para a burguesia agrária, os comerciantes, hospitais e a paz social derivados dos bloqueios ilegais. No antigo jargão esgrimido contra os governos do PT: a PRF estaria "aparelhada" e, como ensinam os esquecidos manuais de ciência política, o "Estado deve estar acima das classes sociais".

O ministro acumula força e autoridade em defesa das instituições burguesas que, afinal, é mesmo sua função. Mas quem disse que a lei comando a História? O novo governo não medirá esforço para restituir a autoridade democrática e republicana ao regime político em crise. Por enquanto, todos parecem bem alinhados na defesa da democracia e de uma transição estável e republicana mesmo quando o protofascista fala de maneira eloquente quando permanece em silêncio. Por primeira vez em muitos anos, janeiro parece tão distante... O paradoxo aparente consiste no fato de que, mesmo batido eleitoralmente, as ruas ainda estão sob comando do protofascista.

4 comentários:

  1. Uma vez posto o fato, e seus personagens, a contradição impera o regime de produção, sendo outros protagonistas, então, na tarefa de esfacelá-la.

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  2. Querido Nildo, concordo contigo. E sobretudo no que tange a amnésia social a que fazes alusão. Por exemplo, no silêncio sepulcral que a esquerda liberal, assim como, na imensa maioria da autointitulada esquerda revolucionária em sequer fazer menção às arbitrariedades do Xandão quando ainda há pouco, agorinha mesmo, decretou a suspensão e censura às redes sociais do Partido da Causa Operária, imputando criminalmente a sua principal liderança Rui Costa Pimenta, assim como a sua militância política. E isto porquê, como que fazendo jus e graça de seu programa político revolucionário, o PCO não apenas propalava palavras críticas a um seu estafeta de turno, mas à instituição como um todo, tecendo a partir de uma avaliação histórico política a pauta de sua extinção. No que tange a isto, creio que mais uma vez, operou a referida amnésia política, seja em direção ao resgate genealógico de tal "entidade" , como também no esquecimento contumaz de quando se percebe a ausência de coro ao cordel encantado da esquerda. A esta hora aciaga, o vozerio dos companheiros do Partido da Causa Operária ecoava livre leve solto e solitário. Saudações cordiais
    André Queiroz

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    1. meu camarada, nós, da RB, lançamos na página oficial uma reflexão sobre a crença nos tribunais que anima a esquerda liberal sob comando do PT. Ocorre que o PCO participa em larga medida das mesmas crenças ao apoiar Lula...

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    2. Certo, Nildo, lerei este artigo, mas desconfio que, no que tange ao PCO, a tal crença aludida não tenha qualquer materialidade. O apoio a candidatura do Lula não é irrestrito, imagina!!! Diria mesmo que se trata de algo reflexo de imenso e riquíssimo debate (não apenas interno), mas de ampla repercussão crítica face às costumeiras posturas da esquerda pequeno-burguesa em seus anseios de postos e representatividade. Todo modo, retomo o que mencionei no comentário acima: seria de se esperar que o PCO fosse o principal alvo das arbitrariedades do STF estivesse ele a este saco de gatos comuns a que aludes, querido Nildo? E quando ao alvo supressivo, como explicar que o PCO estivesse como o Zaratustra de Nietzsche: entre mortos e animais, sem qualquer sombra de companheiros, sem qualquer eco dos vozeiros da revolução no porvir? São questões que me/te coloco - como quem busca esgarçar o por quê do silêncio das coxias...
      André Queiroz

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